O pai que foi espancado após ser confundido com um estuprador enquanto acompanhava a própria filha a caminho da escola, em Botucatu (SP), diz estar traumatizado com as agressões e mal consegue acreditar que ainda existam pessoas que busquem “fazer justiça com as próprias mãos”, relatou ao g1.
O pai, de 36 anos, relembrou o dia das agressões e desabafou sobre o que julgou ser um momento de “selvageria” por parte dos agressores.
“Não tenho palavras para explicar, ainda choro em pensar. Meu sentimento é de impotência, onde os valores que passo para ela se perderam. Foi selvageria”, relata.
O pai contou à polícia que deixou sua filha, de 13 anos, ir sozinha até o Sesi, onde estuda, pela primeira vez na segunda-feira (12). Conforme combinado com a mãe da menina, ele iria acompanhá-la à distância, sem ser percebido pela adolescente, para garantir que não houvesse problemas durante o trajeto.
Neste momento, segundo o registro policial, três pessoas o abordaram e o questionaram por que estava seguindo a adolescente. O homem diz que a abordagem já foi em tom condenatório.
“Quando o motorista me parou da primeira vez, perguntou em tom de ameaça, ‘e aí, mano, perdeu alguma coisa lá com as meninas?’. Prontamente respondi que era minha filha. E continuei seguindo ela”, revela.
“Na sequência, eles foram em direção a elas e perguntaram se o pai dela estava seguindo uma delas. Como minha filha não me viu, pois eu estava sempre a uma distância de dois a três quarteirões, disse que não”, complementa.
Neste momento, três homens iniciaram uma série de agressões contra ele. Conforme o boletim de ocorrência, mesmo relatando ser o pai da jovem, os agressores espancaram e chamaram o homem de “estuprador”, “malandro”, “safado”, “vagabundo”, “mentiroso”. Ainda disseram que iriam “quebrar as suas duas pernas”.
A vítima contou que saiu correndo, sendo perseguido pelos homens, e disse à polícia que, no caminho, foi novamente espancado. O homem relatou que entrou na sede do Senai em busca de ajuda, no entanto, os indivíduos que o seguiam também entraram no local e voltaram a agredi-lo.
As agressões só cessaram quando a jovem e a mãe dela, com quem o homem não tem mais um relacionamento, chegaram ao local e o identificaram como pai da adolescente. Assim que foi esclarecido o fato, os autores das agressões fugiram do local.
“Ela [filha] chegou a ver meu estado quando solicitei para mãe dela ir ao Senai. Ela chegando lá viu a situação que eu estava e entrou em estado de choque. Ela me olhando vendo minha roupa com sangue, todo desalinhado, tremendo de ódio numa mistura com impotência, é de cortar o coração de qualquer um. Ali mesmo ela precisou passar por uma psicóloga”, relembra.
Ainda em meio ao trauma passado pela família, o pai pontua que a condenação prévia, acompanhada das agressões, não deve ser um exemplo na sociedade.
“Ninguém conhece a vida de ninguém. Fazer justiça com as próprias mãos não existe, não sabemos quem está do outro lado. Poderia ser uma pessoa, de fato, de má índole. Mas ela poderia estar portando, por exemplo, uma faca ou uma arma, e no momento levar essas outras pessoas juntos, poderia ter acontecido algo pior”, diz.
No dia das agressões, a polícia foi acionada e um boletim de ocorrência foi registrado como lesão corporal, injúria e ameaça.
Segundo a Polícia Civil, um dos autores já foi identificado e consta no boletim de ocorrência. Os outros estão sendo investigados pelo 1º DP. De acordo com a vítima, os agressores são funcionários e atletas do Sesi de Botucatu.
Ao g1, o delegado seccional de Botucatu, Lourenço Talamonte Neto, afirmou que a polícia aguarda o laudo do Instituto Médico Legal (IML) ao qual a vítima foi submetida para saber a gravidade das lesões. O inquérito, por sua vez, já foi instaurado e o caso está sendo apurado.
Em nota, a assessoria de imprensa do Sesi afirmou ter “tomado ciência dos fatos narrados, uma vez que foi o próprio diretor da instituição que chamou a polícia” e que “aguarda a apuração do que efetivamente ocorreu pelas autoridades competentes”.
No momento, a vítima busca voltar as atenções à saúde mental de sua filha, que ainda está abalada com o caso. Segundo ele, mais do que nunca, pretende acompanhá-la ainda de perto.
“Ela está bem abatida, creio que a ficha dela ainda não caiu. Ela me diz estar bem, mas [pelo] sentimento de pai, vejo que não. Irei sempre acompanhar ela agora, até nosso trauma passar, onde vi que nossa confiança ficou imensamente abalada”, relata.
Fonte: G1